Calculose Renal

por Dr. Paulo Rodrigues

A calculose renal, vulgarmente conhecida como cálculo (ou pedra) renal afeta cerca de 10 a 15% da população.

O cálculo renal se forma pela condensação de cristais normalmente filtrados (retirados) do sangue, que ao se juntarem formarão aglomerados mais difíceis de dissolverem. Muitas pessoas nem sabem que são portadoras de cálculos renais, se eles não afetarem o funcionamento renal ou causarem dor; sendo nestes casos chamados de “cálculos silenciosos”, por serem assintomáticos.

Reconhece-se que populações desprovidas ou com limitação da ingesta de água, apresentam incidências maiores de cálculos, explicando porque países como Arábia Saudita e Egito apresentam índice de até 25% da população com calculose renal, enquanto países Europeus têm prevalência em torno de 10 a 18%.

Entende-se que a calculose renal está intimamente ligada à ingesta de líquidos; e que sua prevenção implica em mudanças definitivas de hábitos, como maior ingesta de líquidos e restrição de dietas.

Cercade 50% das pessoas que tiveram diagnóstico ou cólica renal, terão novo episódio num prazo de até 10 anos, reforçando a impressão de que a calculose renal é uma doença crônica e recidivante, exigindo atenção e aderência individuais dos pacientes aos regimes e terapêuticas de prevenção, sob o risco de voltar a tê-las!

Dor Abdominal ou Cólica Renal

Massas microscópicas de material orgânico e material mineral confluem para formar blocos amorfos de material mais denso que a água, depositando-se no interior do rim.

Estas massas podem bloquear a drenagem urinária renal causando dor e cólica.

A obstrução do fluxo urinário é a principal causa da cólica renal (FASE AGUDA). Diante de um impedimento do livre fluxo urinário, o sistema urinário se dilata de maneira importante (hidronefrose), a fim de manter a produção de urina.

Num primeiro momento, o fluxo urinário aumenta, como forma de manter o rim funcionando; ao mesmo tempo que a dilatação do sistema urinário força, por pressão das contrações peristálticas, a descida do cálculo. É neste momento; quando a pressão intra-renal aumenta abruptamente, que a dor intensa (cólica renal) se instala em ondas, levando alguns pacientes a desmaiarem, e a experimentarem: “… a pior dor que se possa imaginar!”.

Este processo, no entanto, não é infinito e ilimitado. A reação seguinte do organismo é interromper a produção de urina através da diminuição do fluxo sanguíneo intra-renal, levando-o a diminuir a produção de urina, com subseqüente melhora da dor. Entretanto, a isquemia (diminuição da circulação sanguínea renal) promove lesões renais irreversíveis, ainda que a dor possa melhorar significativamente (FASE CRÔNICA) após um período variável de 3 a 30 dias.

A falta de irrigação sanguínea intra-renal promove isquemia irreversível dos glomérulos, causando “perda renal”.

Como se formam os cálculos renais

A calculose renal não é uma doença cuja responsabilidade possa ser imputada a um único fator, sendo na maioria das vezes resultado da somatória de vários, nem sempre tão aparentes.

A exceção são os cálculos renais de origem metabólica, cujo erro inato do metabolismo renal e/ou intestinal, faz com que, uma ou outra substância seja seletivamente eliminada em grandes concentrações na urina, pela falta ou excesso de atividade de uma determinada enzima. Nestas circunstâncias, as altas concentrações de um determinado soluto precipitam-se para formar um cálculo precocemente. Como o excesso de soluto é resultado de uma alteração metabólica, a correção demanda intervenção medicamentosa ou forte restrição dietética, a fim de minimizar a recorrência de cálculos. Não raro, as crianças já apresentam cálculos renais e tem uma vida marcada por recidivas. O cálculo mais freqüente nesta situação é o de cistina, e felizmente compõe somente uma pequena parcela de todos os tipos de cálculos renais.

Classificação Etiológica dos Cálculos Renais em 1936 Pacientes

Causa Número de casos %
Ácido úrico 260 13.0%
Hiperccalciúria 213 11.1%
Infecções Urinárias 191 9.9%
Má-formação Anatômica Renal 87 4.4%
Ingestão Aumentada de Àlcalis 57 2.9%
Hiperparatireoidismo 54 2.7%
Cistinúria 21 1.1%
Doenças Òsseas 19 1.0%
Hiperoxalúria 8 0.4%
Acidose Tubular Renal 6 0.3%
Causa Idiopática 1029 53.2%

O excesso de uma componente na urina (soluto) predispõe que este produto ultrapasse sua capacidade de solubilidade, levando à deposição excessiva deste soluto nas áreas com baixo fluxo urinário, predispostas à deposição destes cristais concentrados excessivamente.

Este processo chamado de super-saturação físico-química, forma o núcleo de precipitação, capaz então de atrair subseqüentemente, outras partículas suspensas na urina aumentando o volume da massa calculósica por agregação de micro-partículas.

A super-saturação é um processo extremamente dinâmico e flutuante, sofrendo enorme variação ao longo do dia, sendo por isso muitas vezes difícil de impedi-la. Ou dito de outra forma, algumas poucas horas ou mesmo minutos, de desidratação, podem ser suficientes para que os cristais fiquem excessivamente concentrados na urina.

Cada cristal apresenta um coeficiente químico-térmico de diluição (Kp). Embora facilmente calculado na água, este coeficente é mais difícil de ser calculado na urina, que é um líquido muito mais complexo. Ademais, o ponto em que cristais se adensam – conhecido como ponto de “metastatização”, sofre influencia da presença de outros solutos, do pH e da temperatura, todos eles variáveis ao longo do dia.

Após a metastatização, a nucleação dos cristais se faz nas superfícies heterogêneas, que agem com pontos de atração dos cristais. Estas “superfícies” podem ser os conglomerados celulares dispersos na urina, glóbulos vermelhos, outros cristais solúveis ou a superfície irregular do interior do rim, num processo chamado de nucleação heterogênea.

Uma vez formado um primeiro núcleo, outros cristais de configuração atômica semelhante se aproximarão para dar volume ao núcleo, num fenômeno chamado de epitáxia. Assim estará formado um minúsculo cálculo que só tende a crescer!

Anatomia

A deposição de cristais suspensos em excesso obedecem uma lógica mais complexa, onde a anatomia intra-renal colabora ou não com a deposição destes cristais.

A conformação anatômica do rim, particular para cada indivíduo; facilita ou dificulta o acúmulo destes cristais nas valéculas renais, dando início ao primeiro passo para a deposição subseqüente de cristais adicionais.

Se por um lado a anatomia macroscópica pode contribuir para a formação de cálculos; é também na micro-estrutura anatômica, dentro dos túbulos renais que este fenômeno ocorre, havendo deposição de “poeira” cristalóide, formada pelo excesso de cálcio, fósforo, oxalato e uratos na superfície da célula, iniciando um acúmulo progressivamente difícil de desfazer.

Dentre os fatores proponentes à formação de cálculos renais vários vêm à cena, para formarem ou combaterem a formação.

Dentre eles destacam-se:

  • Fatores genéticos
  • Alimentação
  • Ingesta de líquidos (hidratação)
  • Absorção intestinal
  • Absorção e excreção renal
  • Ph urinário
  • Fatores uroteliais
  • Fatores comportamentais e sociais
  • Medicamentos

Alimentação

A dieta alimentar influencia vários processos patológicos e aparentemente não seria diferente para os pacientes formadores de cálculo. 

Mas será esta uma verdade absoluta?

Ainda que a cirurgia possa fazer com que o paciente fique livre de um cálculo, é o tratamento regular e constante que garante que os cálculos não recorrerão!

Como a dieta influencia a quantidade de cristais e o pH urinários, este fatores afetam diretamente a chance de haver um processos de nucleação e  deposição de cristais na urina.

A concentração excessiva de um ou de outro elemento cristalóide na urina está condicionada à ingesta alimentar excessiva deste elemento. Entretanto, a concentração aumentada desta substância na urina, também pode decorrer da excessiva excreção pelos rins desta substância, resultado dos rins não conseguirem reter ou absorver a quantidade filtrada do sangue.

No caso de uma alimentação rica em determinada substância ou soluto, há uma evidente hiperabsorção indevida, e não necessária; que resultará num nível sanguíneo elevado. Este aumento indesejado, provocado por uma dieta “carregada” deste elemento, exige que o rim aumente a filtração renal, a fim de excretar o excesso indesejado, aumentando assim a concentração urinária desta substância.

Um exemplo de fácil compreensão ilustra este fenômeno quando se pensa no cálcio, por exemplo. A alimentação com grandes quantidades de cálcio provoca uma sobrecarga intestinal de cálcio resultando numa elevação dos níveis plasmáticos, decorrente da absorção excessiva, como por exemplo, quando se ingere um sorvete, num dia muito quente. Se o organismo já estiver repleto das necessidades de cálcio, o excesso precisará ser excretado pelos rins, a fim de manter os níveis sanguíneos de cálcio estáveis. Esta compensação fisiológica, em direção ao equilíbrio será feito independentemente da quantidade de água disponível. Se a quantidade de água for baixa, a concentração de cálcio na urina se elevará aumentando a chance de cristalização intra-renal.

Embora o senso comum diga que o a alimentação com excesso de cálcio possa promover a formação ou ser a causa de cálculos renais ricos em cálcio; na verdade um dieta pobre em cálcio parece estar mais relacionada á formação de cálculos do que o oposto, pois o cálcio parece neutralizar o oxalato no interior do intestino. Assim ao contrário do esperado, uma maior disponibilidade de oxalato no intestino, por falta de cálcio, ofertaria concentração de oxalato para ser absorvido, que por conseqüência seria excretado na urina; aí sim, juntando-se ao cálcio urinário e levando a uma precipitação urinária com densidade 15X maior que o cálcio sozinho e portanto, favorecendo uma deposição.

Fluxo Urinário

O fluxo urinário intra-renal, resultado da produção urinária, promove um clareamento (limpeza) dos cristais excessivamente filtrados e concentrados na urina por qualquer motivo, evitando sua deposição nos interstícios e valéculas intra-renais. Assim, torna-se fácil compreender porque uma ingesta alta e regular de líquidos tem poder terapêutico e preventivo na formação de novos cálculos renais.

No entanto ao contrário do que se imagina, a ingesta excessiva (exagerada) não promove o mesmo efeito preventivo, havendo casos em que os cálculos são o resultado de uma hidratação em níveis acima do fisiológicos (ler abaixo).

Fatores Físico-químicos de Proteção

O excesso de solutos na urina propicia a deposição de cristais conjugados, que formarão um futuro cálculo. Em contra-partida, o organismo se defende desta tendência, agindo de maneira inversa, aumentando a solubilidade do excesso de cristais urinários, evitando que o processo de deposição ocorra.

Dois destes elementos, intrinsicamente presentes na urina, são o citrato e o magnésio, que aumentam a solubilidade urinária. Em situações patológicas, ou de desequilíbrio, eles podem estar diminuídos ou ausentes, facilitando mais precocemente a deposição de cristais no interior dos rins.

A hiper-hidratação (ingesta excessiva de líquidos, sobretudo de água) pode diluir excessivamente os fatores protetores, causando paradoxalmente mais cálculos, ao anular o efeito protetor.

Fatores Uroteliais

Uma das teorias da formação de cálculos renais, explica que o processo incipiente para a deposição inicial de micro-cristais depende da irregularidade epitelial que facilita a ancoragem destes pacotes de micro-cristais, formando o que se chama de placas de Randall (muitas vezes identificados em exames de tomografia e descritos como “areia, mas não cálculo”). Mais precisamente localizados no interior dos túbulos renais distais, exteriorizam-se à medida que a deposição se acumula, como num delta de rio, que deposita sua sujeira por arrasto.

Fatores comportamentais, de trabalho e hábitos

Determinados grupos de pessoas, tornam-se sem perceber, grupos de alto risco de formação de cálculos. A ingesta habitualmente diminuída ou irregular de líquidos, promovido por atividades profissionais, tais como cozinheiros e auxiliares que trabalham em ambiente de ar-condicionado (ambiente excessivamente seco), estão regularmente desidratados.

Ainda que não admitam, dizendo que não sentem cede, ela é simplesmente fruto de uma adaptação das glândulas sudoríparas e de ajuste termo-regulador da hipófise, para uma necessidade maior de preservação de líquidos no organismo, em que os rins são atores principais, produzindo urina concentrada, rica de solutos e propícia à deposição de cristais.

Reconhece-se facilmente em estudos populacionais, que populações de desertos ou clima árido, pessoas profissionalmente ativas ou mesmo mais jovens, apresentam maior incidência de calculose renal, pelo simples fato de se disponibilizarem menos a tomar líquidos.

pH urinário

A ingesta de determinados alimentos, uso de laxativos intestinais, uso de crônico de Vitamina C, sal-de-frutas (rica em bicarbonato), etc, podem alterar o fino balanço que mantém o pH urinário num ponto ótimo de equilíbrio que permita que os solutos fiquem dissolvidos numa determinada quantidade de líquido.

A produção de urina mais ácida facilita a deposição de cristais básicos (ácido úrico), enquanto a urina alcalina facilita a deposição de cristais do tipo oxalato e fosfato de cálcio.

Infecção urinária

Normalmente, o tato urinário não contém bactérias, sendo portanto, estéril.

Algumas bactérias (Pseudomonas sp, Klebsiella sp , Proteus mirabilis e Staphylococcus aureus), quando habitantes do trato urinário alto (Rim), degradam a uréia largamente presente na urina, em amônia; produzindo amônio-trifosfato-magnesiano, que rapidamente se confluem para formar grandes massas calculósicas nos espaços ocos intra-renais, formando os chamados cálculos coraliformes, cuja denominação provém de se parecerem com grande corais.

Por provocarem um processo infeccioso e inflamatório crônico no interior do rim e retração parenquimatosa, com dano da capacidade de filtração renal, os pacientes com este tipo de cálculo podem rapidamente evoluir com insuficiência renal crônica.

Investigação Metabólica da Calculose Renal

A investigação metabólica em pacientes com calculose é mandatória naqueles cuja história é recorrente, ou naqueles em que apesar do cálculo existir, ele não seria esperado.

Anteriormente, acreditava-se que a análise cristalográfica ou química do cálculo poderia mostrar seus componentes, levando ao raciocínio imediato de que a diminuição da oferta destes mesmos componentes por uma redução na dieta promoveria diminuição na ocorrência dos cálculos. Esta teoria mostrou-se errada, incongruente e por demais simplista, pois se esquecia da dinâmica da química urinária. 

Largamente empregada no passado, a análise espectroscópica do cálculo, ainda que revele seus constituintes químicos, não expressa a dinâmica metabólica urinária dos fenômenos que levaram à formação do cálculo, mas tão somente seu produto final; e portanto ainda que seja empregada  hoje, deve ser analisada com restrição.

Na década de 70 se passou a estudar o comportamento e a reação dos componentes urinários observados diante da ingesta de sobrecargas estabelecidas de cálcio, ácido úrico ou oxalato, controladas com medidas freqüentes em laboratório durante uma internação hospitalar, onde se recolhia toda a urina e se controlava o que e quando e quanto o paciente comia ou bebia de líquidos. A urina era colhida por 3 dias consecutivos, antes e após as refeições estabelecidas. 

Desta maneira, desarranjos que provocassem hipercalciúria (excreção urinária aumentada de cálcio), hiperoxalúria (excreção urinária aumentada de oxalato, hipocitratúria (excreção urinária diminuída de citrato) e hiperuricosúria (excreção urinária aumentada de ácido úrico) poderiam ser diagnosticadoss e corrigidos por medicamentos ou por alterações na dieta.

Entretanto, estes testes necessitavam regulação extrema da dieta e da ingesta de líquidos, sendo freqüentemente necessário internação hospitalar. Estudos posteriores mostraram que a colheita e análise da urina, não em 3 dias consecutivos, mas em 24 h, produziam resultados muito semelhantes, permitindo se chegar às mesmas conclusões.

Desta forma, concluiu-se que exames de sangue e amostras urinárias, preferentemente de 24 h, obtidas num dia regular de alimentação, podem revelar causas insuspeitas da formação de cálculos renais, em substituição aos exaustivos exames citados, que passaram a ter seu emprego restrito às finalidades acadêmicas.

Deve-se estar atento que a colheita do exame deve obedecer e espelhar exatamente um dia ordinário na vida do paciente, pois alterações na dieta ou da quantidade de líquidos ingeridos alteram significativamente o enredo diagnóstico.

Dieta – Efeito da Modificação dos Hábitos Alimentares

A dieta alimentar influencia vários processos patológicos e aparentemente não seria diferente para os pacientes formadores de cálculo. 

Mas será esta uma verdade absoluta?

Ainda que a cirurgia possa fazer com que o paciente fique livre de um cálculo, é o tratamento regular e constante que garante que os cálculos não recorrerão!

Como a dieta influencia a quantidade de cristais e o pH urinários, este fatores afetam diretamente a chance de haver um processo de nucleação e  deposição de cristais na urina.

Fluídos (Líquidos Ingeridos)

A associação entre baixa ingesta de líquidos e cálculo está bem reconhecida, observando-se maior incidência de cálculos em salva-vidas (ficam expostos ao calor intenso muito tempo) e maratonistas (experimentam intensa desidratação) (Milvy P ET cols. A high incidence of urolithiasis in male marathon runners. J Sports Med Phys Fitness 3: 295, 1981), mas é de se estranhar que estudos populacionais que analisaram o volume de ingestão de líquidos entre pacientes formadores de cálculos e naqueles sem cálculos mostraram-se semelhentes (Power C et cols. Diet and renal Stones: a case-control study. Brit J Urol 56:456, 1984), assim como o volume urinado (Ljunghall S ET cols. Urinary eletrolytes in renal Stone formers and healthy subjects. A population study of 60-year-old men. Scand J Urol Nephrol 11 (Suppl 41):55, 1977), pondo dúvidas quanto ao raciocínio simplista de que o aumento da ingesta de líquidos evitaria com sucesso a formação de cálculos, mas deixando claro que a formação de cálculos renais, obedece a uma lógica muito mais complexa.

Sabe-se que a desidratação promove concentração dos cristais urinários e diminuição do seu pH (acidificação), sobretudo do ácido úrico, levando à ao fenômeno de epitaxe (formação de uma núcleo microscópico de pequenos aglomerados de urato) que atraem outros cristais afeitos, como o cálcio, por exemplo.

Assim, evitar este primeiro fenômeno é primordial, devendo o indivíduo evitar ficar desidratado em qualquer circunstância, pois uma vez formado este núcleo, ele não poderá ser desfeito, mas apenas “varrido” do rim, enquanto for microscópico; o que a hidratação vigorosa pode fazer com grande eficácia.

Tipos de Líquidos

Lendas abundam sobre os líquidos que seriam mais promotores na formação de cálculos, em comparação com outros menos predisponentes.

Não há evidência científica que demonstre que água mineral (não filtrada), rica em traços de minerais naturais (magnésio, ferro, manganês, etc) seriam mais litogênicas que outros fluídos. 

Da mesma forma, recomenda-se a ingesta de que 30 ml/kg/dia (ou cerca de 2000 ml/dia) de líquidos para se atingir o grau de proteção para a formação de cálculos. No entanto, este volume deve ser distribuído ao longo do dia, havendo autores que recomendam 250 ml de água a cada 4 h, além da ingesta de alimentos que se estime, contenha outros 250 ml (Consensus Conference. Prevention and treatment of stone former. JAMA 260: 977, 1980). Este regime comprova que 70% dos casos de cálculos de cálcio e 40% dos cálculos de ácido úrico podem ser prevenidos, mas naqueles que desejam reduzir ainda mais este índice, devem usar fitas de medição urinária da densidade urinária, objetivando atingir densidade menor que 1010 (McComarck M et col.s The urine specific gravity dipstick: a useful tool to increase fluid intake in stone forming patients. J Urol 146:1475, 1991).

Ingesta de Sódio (Sal)

Pessoas acostumadas a ingerir quantidades aumentadas de sal (Cloreto de Sódio – NaCl) por razões diversas de paladar ou hábito, propiciam maior excreção de cálcio na urina, pois impedem a troca de íons nas células tubulares renais que absorvem sódio em troca de cálcio, causando secundariamente hipercalciúria.

A ingesta elevada de sódio na dieta, adicionalmente também eleva a excreção de sódio na urina, como seria de se esperar, pois aderem aos cristais monouratos formando cristais de urato monossódico. Ainda que estes cristais não se juntem expressivamente para formar massas calculósicas significativas, eles propiciam o fenômeno de epitáxia, que nada mais é que a formação inicial de um núcleo microscópico capaz de atrair outros micro-cristais, sobretudo de cálcio, agora sim; agregadores e crescentes na formação de cálculos renais significativos

Ingesta de Cálcio

Tradicionalmente, a restrição de alimentos ricos em cálcio ou derivados de leite são a base de qualquer recomendação eficaz para prevenção de cálculos.

Mas será verdade?

Infelizmente, assume-se que o aumento da excreção de cálcio na urina está diretamente relacionada à ingesta aumentada de cálcio na dieta. Mas este não é o caso, pois a diminuição no consumo de cálcio pode inclusive aumentar a chance de se formar cálculos renais, pois a restrição de cálcio faz com que os intestinos absorvam mais oxalato (Bataille P et cols cols. Effect of calcium restriction on renal excretion oxalate and the probability of stones in the various pathophysiological groups with calcium stones. J Urol 130: 218, 1983) gerando hiperoxalúria, que aumenta em 10% o risco de se formar cálculo de cálcio, uma vez que o excesso de oxalato absorvido conglomera-se quimicamente a outros ânions para formar pontes químicas estáveis e mais pesadas. Ademais, a restrição de cálcio alimentar, diminui a excreção urinária de cálcio minimamente, pois se a oferta pela dieta está diminuída, a Vitamina D3 estimula maior absorção da dieta restritiva e mobiliza o cálcio armazenado nos ossos – rica fonte mobilizável de cálcio.

Esta intricada relação do metabolismo de íons no rim – intestino-suor-disponibilidade de líquidos fica ainda mais complexa quando se demonstrou em pessoas normais, que o aumento da ingesta de cálcio de fato diminuía, e não aumentava, em 34% a chance da formação de cálculos (Curhan GC et cols. A prospective study of dietary calcium and other nutrients and the risk of symptomatic kidney stones. New Engl J Med 328: 833, 1993).

Assim, parece que a hipercalciúria (excreção aumentada de cálcio na urina) pode ser tipo 1 (independente da dieta) , tipo 2 (dependente da dieta)  e tipo 3 (relacionada à fosfatúria). 

A restrição da ingesta de cálcio diminui somente a hipercalciúria tipo 2. Nos demais tipos (1 e 3) é necessário também se diminuir a hiperoxalúria secundária restringindo-se adicionalmente a ingesta de oxalato.

Nos casos onde a ingesta de cálcio deve ser estimulada, como quando há necessidade de tratamento de osteoporose, osteopenia ou menopausa, reconhece-se que a hipercalciúria se desenvolve quando a suplementação com cálcio se inicia, observando-se em seguida normalização dos níveis urinários de cálcio após 3 a 4 meses. Portanto, a suplementação com cálcio para tratamento da osteoporose deve ser estimulada, mesmo naqueles pacientes com cálculos, contanto que recebam ingesta hídrica suplementar nos primeiros meses do início do tratamento.

Ingesta de Oxalato

A maioria dos cálculos renais apresentam oxalato entre seus componentes, e vêm principlamente do metabolismo endógeno de glicina, glicolato e hidroxiprolina, sendo somente 10-15% proveniente da dieta. Desta maneira não há como diminuir a produção endógena de oxalato! Ainda que não se observe diferenças entre a quantidade de oxalato na urina em pacientes com ou sem cálculos renais, acredita-se que se possa diminuir a concentração de oxalato na urina, se se diminuir dramaticamente a ingesta.

Aí esta o problema, o oxalato, assim como o cálcio, está universalmente distribuído nos alimentos, ainda que somente 8 a 12% da quantidade ingerida seja absorvida diariamente (Trinchieri A et cols. The influence of diet on urinary risk factors for stones in healthy subjects and idiopathic renal stones formers Brit J Urol 67: 230, 1991) sendo portanto, extremamente difícil de se controlar ou se restringir a quantidade ofertada num alimentação regular. A intricada rede de relações entre cálcio e oxalato, ainda é temperada pelas bactérias intestinais, que degradam o oxalato no lúmen intestinal. A ausência de bactérias  degradadoras de oxalato (oxalobacter formigenes) proporciona maior quantidade nos intestinos, aumentando sua absorção e por conseqüente a concentração urinária, que ao ultrapassar certo limite levará à deposição intra-renal. Da mesma maneira, se o oxalato estiver quimicamente ligado ao cálcio, ele não será absorvido. Assim, uma dieta pobre em cálcio, ao contrário do senso comum, pode aumentar o risco da ocorrência de cálculos. E não evitá-los!

Ingesta de Proteína

Sociedades que consomem maior quantidade de proteína apresentam incidência aumentada de cálculos, quando comparadas àquelas com alimentação mais restritas e pobres em proteína (Marangella M et cols. Effect of animal and vegetal protein intake on oxalate excretion in idiopathic stone disease. Brit J urol 63: 348, 1989).

Os mecanismos responsáveis por esta observação são complexos e provavelmente se relacionam ao aumento da filtração renal, com conseqüente calciúria, oxalúria e uricosúria, além da acidose metabólica transitória, decorrente da sobrecarga de proteína animal exagerada. A acidose transitória leve, após uma farta refeição de proteína (carne, por exemplo), diminui o citrato urinário (fator protetor da deposição de cristais na urina) e mobiliza o cálcio nos depósitos ósseos aumentando sua concentração urinária por inibição da reabsorção do cálcio nos túbulos renais distais. Ainda que todos estes fenômenos sejam observados em todos os pacientes que ingerem grandes quantidades de carne, o efeito calciúrico é maior nos pacientes formadores de cálculos.

A quantidade aumentada de ácido úrico, proveniente da digestão excessiva de proteínas complexas, aumenta, ainda que transitoriamente a quantidade de ácido úrico na urina, novamente propiciando o fenômeno de epitáxia – formação de núcleos microscópicos de cristais capazes de agregar outros íons (cálcio, por exemplo) aumentando o volume do cálculo.

Ingesta de Citrato

O citrate funciona como importante “buffer” de cálcio na urina; quelando (aderindo-se) ao cálcio para formar um molécula mais solúvel e eletroliticamente mais neutra na urina.

Proveniente da absorção intestinal, o citrato é transformado em bicarbonato (HCO3). Este mesmo bicarbonato reconstitui-se volta a se transformar em citrato na urina, dependendo do pH na urina.

A acidose, observada em situações de diarréia, acidose tubular renal, exercícios físicos, hipopotassemia e ingesta aumentada de proteínas) diminui a excreção de citrato, enquanto a alcalose aumenta sua disponibilidade, promovendo a variação do pH urinário.

Casos onde se observam hipocitratúria primária (diminuição da excreção de citrato na urina) são observados em 10 a 15% dos casos com calculose renal, que se corrigidos diminuem expressivamente sua ocorrência (Menom M te cols. Urinary citrate excretion in patients with renal calculi. J  Urol 129: 1158, 1983).

A alimentação rica em frutas cítricas, ou a ingesta de sucos cítricos (por exemplo, suco de limão ou laranja) ricas fontes de citrato, podem reverter a tendência de formação de cálculos, mas a ingesta precisa ser normatizada de maneira a que não haja período longo sem que se ingira o referido suco. Além do mais, os sucos cítricos só provocam o desejado efeito, se forem ingeridos em volume superior à 2000 ml devem ser ingeridos por dia, o que transforma esta alternativa pouco atrativa como tratamento de longo prazo.

Suplementação com Magnésio 

Ao lado do citrato, o magnésio é elemento químico reconhecido com capacidade de aumentar a solubilidade urinária, evitando o crescimento por agregação de cristais de oxalato de cálcio nos túbulos renais.

A suplementação de magnésio, por fontes externas, não altera as quantidades de oxalato ou cálcio excretados, mas aumenta suas solubilidades, minimizando o processo de cristalização.

A ingesta intestinal aumentada de magnésio forma com o oxalato, pontes químicas mais firmes e estáveis do que com o cálcio, evitando assim que o oxalato seja absorvido (Johansson G et cols. Biochemical and clinical effects of prophylactic treatment of renal calcium stones with magnesium hydroxide. J Urol 124: 770, 1980).

Ingesta de Refrigerantes

Refrigerantes são ricas fontes de cálcio, oxalato e guanosina, que se convertem para ácido úrico, quando ingeridos, mas não se tem comprovação médica de que possam aumentar o risco efetivo de calculose renal.

Ingesta de Álcool 

A ingesta aguda de álccol produz elevação da excreção de cálcio e magnésio. Mas é a ingesta repetida e crônica de álcool que produz aumento expressivo de cálcio e fósforo na urina, devido à mobilização dos depósitos de cálcio nos ossos, que associado a má-alimentação, freqüentemente observado em alcoólatras; vêm seu potencial litogênico na urina aumentar.

Ingesta de Fibras

A ingesta regular de fibras como forma de se minimizar a formação de cálculos tem sido usada há longo tempo.

Não se sabe exatamente seu mecanismo de ação, mas observa-se de fato que a ingesta de 10 a 15 g diárias de fibras diminui a ocorrência de cálculos em pacientes com cálculos de oxalato de cálcio.

Acredita-se que as fibras agiriam quelando (agarrando) o cálcio intestinal diminuindo a quantidade absorvida, enquanto outros acreditam que as fibras presentes no intestino acelerariam o trânsito intestinal, diminuindo o tempo de exposição do intestino para absorção dos elementos formadores de cálculo. Outros ainda acreditam que as fibras seriam ricas fontes de oxalato, que se ligariam ao cálcio, evitando assim que ele fosse absorvido (Jahnen A et cols. The dietary fibre. The effectivenessof a high bran intake in rducing renal brain excretion. Urol Res 20:3, 1992).

Avaliação por Métodos de Imagem

A situação mais comum do paciente com cálculo renal é a dor.

Freqüentemente atendido no pronto-socorro, o paciente que sabe ter um cálculo renal, pode começar sua investigação com uma radiografia simples de abdômen; muitas vezes suficiente para se determinar a presença do cálculo responsável pela dor.

No entanto, a radiografia simples do abdômen apresenta importantes limitações, pois devido à presença de gases e fezes no abdômen, pode impedir a visualização adequada de todo o abdômen, ou produzir artefatos confundidores. Muitos pacientes progridem na avaliação da causa da dor, realizando à critério médico, o exame de ultrassonografia ou tomografia computadorizada.

A ultrassonografia abdominal apresenta vantagens por não expor o paciente à fontes ionizantes de energia (Raios-X) e estar disponível em muitos centros médicos pelo seu mais baixo custo, quando comparado à tomografia.

Já a tomografia computadorizada, sendo exame mais caro, estar menos disponível e associada à fontes ionizantes; apresenta a espetacular vantagem de ser 100% específica (isto é; se há cálculo, ele sempre poderá ser visualizado; não deixando dúvidas), e não apresentando falso-negativos. Ademais, a composição e dureza do cálculo (massa cálculósica) pode ser facilmente estimada com o cálculo das Unidades Housfield (HU). Quanto mais denso o cálculo, mais duro ele será, e mais difícil será sua fragmentação.

Tratamento Conservador ou Expectante

Cerca de 90% dos cálculos ureterais serão expulsos espontaneamente, após um tempo, ainda que possam cursar com fortes dores que interrompam a espera ou com comprometimento da função renal.

Entretanto, 99% dos casos de cálculos maiores que 6 mm necessitarão de intervenção médica. Ainda que se possa espera até 3-4 semanas, reconhece-se que a espera dificulta a tecnicamente a intervenção cirúrgica, assim com o índice de resolução do problema obstrutivo – “quanto mais se espera, menor é a chance de desobstrução numa primeira tentativa” (Reilly, Robert F. (2005). Nephrology in 30 Days. UNC Press. pp. 195).

Tratamento Cirúrgico

O tratamento cirúrgico dos cálculos urinários depende do tamanho e da localização do mesmo.

Além disto, a intensidade da dor e a obstrução urinária provocadas podem ser decisivos para se optar por uma ou outra alternativa de tratamento, desde que o se tenha como objetivo principal a manutenção da função renal, sempre primordial.

Cálculos Renais

Cálculos renais podem ser primariamente tratados com litotripsia extra-corpórea. Este método, incorporado à medicina na década de 80, possibilitou tratar cálculos de maneira não invasiva através de ondas eletro-magnéticas.

Deve-se pesar se alguns cálculos, embora assintomáticos, devam ser tratados, pois muitos, embora assintomáticos, são descobertos durante exame médico de rotina. No entanto, deve-se levar em conta que 70% dos cálculos irão crescer ao longo do tempo e somente 30% ficarão estáveis e do mesmo tamanho. Adicionalmente, sabe-se que embora assintomáticos, 35% dos cálculos irão se mover, obstruindo o riml e causando importante cólica, que exigirá tratamento da dor, em caráter de urgência.

Como a litotripsia extra-corpórea representa tratamento não-invasivo, com mínima morbidade e de baixo custo médico e social, a permissividade no seu uso deve ser amplamente debatida com o médico assistente, a fim de pesar vantagens e desvantagens para cada caso.

A composição e o tamanho do cálculo interferem diretamente no índice de sucesso da fragmentação e do clareamento intra-renal (isto é, limpeza total do rim).

Cálculos cujos processos físicos-químicos de cristalização geram pontes químicas muito resistentes formam cálculos muito “duros”, difíceis de quebrar, exigindo frequentemente mais de uma sessão para fragmentação completa, ou acabam por formarem o grupo de insucesso ou falha do tratamento.

O índice de sucesso (fragmentação total) do cálculo tratado por litotripsia extra-corpórea, depende também da localização do cálculo e da anatomia renal, que é particular para cada rim. 

Cálculos localizados nos grupos caliceais superiores, apresentam índices de clareamento mais altos, se comparados aos localizados nos grupamentos médios e inferiores.

Nos cálculos localizados nos cálices inferiores, o ângulo de junção da pélvica-ureteral também influencia nos índices de clareamento pós-litotripsia extra-corpórea por determinarem a facilidade com que os cálculos serão excretados.

Em cálculos caliceais inferiores menores que 15 mm em diâmetro, a aplicação de litotripsia produz clareamento em 52%, mas de apenas 17% se o ângulo pélvico-infundíbular e/ou a o canal do infundíbulo for menor que 5 mm de diâmetro.

Similarmente, cálculos caliceais maiores que 1 ou 2 cm, por apresentarem massas calculósicas grandes, podem ter o sucesso da fragmentação diminuído, pois a litotripsia extra-corpórea, pode falhar em fragmentá-lo ou gerar fragmentos maiores que 4 mm de diâmetro, dificultando sua expulsão espontânea.

Desta maneira, alguns estudos argumentam que a melhor opção terapêutica para estes casos é o tratamento cirúrgico. Neste pormenor, a litotripsia percutânea ou o uso de litotriptor a LASER com ureteroscópio flexível produzem índice de clareamento (limpeza do rim) em 90% dos casos, enquanto a litotripsia extra-corpórea deixa somente 29% dos casos totalmente livres de cálculo.

Em casos com massas calculósicas volumosas, a cirurgia tradicional (com abordagem do rim através de incisão cirúrgica convencional) representa opção viável onde os recursos tecnológicos não permitem abordagem minimamente invasiva. Entretanto, reconhece-se que pacientes submetidos à tratamento cirúrgico tradicional (cirurgia aberta) têm perda mais expressiva da massa renal, refletindo-se na chance futura de desenvolver insuficiência renal crônica por perda da capacidade de filtração renal, no prazo de 5 a 10 anos. 

Desta maneira, em qualquer circunstância, sobretudo em pacientes jovens (com expectativa de vida longa) ou naqueles com algum grau de comprometimento renal já demonstrado (elevação de creatinina ou rebaixamento do clearance de creatinina) as técnicas minimamente invasivas, representam a melhor opção terapêutica, e devem ser priorizadas.

Atendendo</span a tendência de cirurgias menos mórbidas, verificou-se rápido declínio das cirurgias tradicionais abertas na última década (Assimos DG ET cols. The role of open stone surgery since extracorporeal shock wave lithotripsy J Urol 142: 263, 1989)

Nos casos submetidos à cirurgia percutânea, o acesso trans-cutâneo por punção guiada por ultrassonografia ou radioscopia, permite acesso à cavidade renal permitindo a introdução de probes ultrassônicos, com LASER ou eletro-hidraúlicos; que fragmentam o cálculo diretamente por contato. Desta maneira, a eficiência da fragmentação é otimizada, com níveis de clareamento renal da ordem de 85% a 100%.

Cálculos coraliformes que preenchem vários cálices, dificultando o acesso numa só punção cirúrgica, podem exigir tratamento sanduíche; isto é, obtém-se a diminuição do volume do cálculo com cirurgia percutânea (nefrolitotripsia percutânea) e subseqüentes sessões de litotripsia extra-corpórea, para se fragmentar os cálculos restantes. Entretanto, esta abordagem pode encarecer o tratamento global pela associação e repetições. Assim, abordagem agressivas, com múltiplas punções renais, podem ser mais vantajosas embora obtendo-se índice de clareamento calculósico renal total em 50% dos casos numa única sessão (Rao PP et cols. The relative cost-effectiveness of PCNL and ESWL for médium sized (2 cm) renal calculi in a tertiary care referral Center. Ind J Urol 17: 121,2001).

Cálculos Ureterais

Cálculos ureterais representam a situação mais crítica e aguda da doença litiásica, pois refletem a migração de um cálculo freqüentemente formado no rim, e que se deslocou para o ureter.

Uma vez no ureter, mecanismos naturais intrínsecos tentarão impeli-lo para a bexiga, a fim de expulsá-lo.

Cerca de 70% dos cálculos ureterais < 5 mm de diâmetro terão expulsão espontânea, mas somente 50% daqueles maiores que 5 mm conseguirão ser expulsos.

Cálculos medindo cerca de 1 cm mais ou menos, ou naqueles com quadro de dor exuberante, que impedem a drenagem urinária ou há infecção, o tratamento endoscópico cirúrgico é mandatório.

Como o canal ureteral tem diâmetro muito limitado (fino), o cálculo migrado do rim pode interromper o fluxo urinário, causando dilatação renal, aumento da pressão intra-renal e por conseqüente muita dor em cólica.

Os cálculos ureterais podem obstruir o trato urinário em 3 pontos diferentes

  • Ureter proximal
  • Ureter médio 
  • Ureter distal

As técnicas endoscópicas avançaram muito devido à melhora na qualidade e calibre dos aparelhos que permitem e introdução de finas cânulas e instrumentos nas vias urinárias. No entanto a arte de realizá-las ainda se assenta na experiência e curva de aprendizado de cada cirurgião, observando-se que os índices de falha na retirada de cálculos correlacionam-se com o tempo em que o cirurgião vem fazendo a cirurgia. Weinberg demonstrou que havia falha para se retirar os cálculos renais em 29% dos casos quando o cirurgião começava a fazer a cirurgia, mas esta falha caia para 8% após alguns anos (Weinberg JJ ET cols. Complications of ureteroscopy in relation to experience: reporto f survey and author experience. J Urol 137: 384, 1987);

Ureter proximal

Cálculos impactados no ureter proximal, podem ser tratados primariamente através de litotripsia extra-corpórea. O índice de sucesso varia de 50 a 100%, dependendo do tamanho e dureza do cálculo.

Casos mais complexos, associados à forte dor e/ou infecção, podem exigir a desobstrução imediata, com passagem de catéter ureteral endoscópico, preparando-se o caso para o tratamento desobstrutivo definitivo.

O recurso de ureteroscopia com fragmentação in situ do cálculo através da visualização direta do mesmo após acessá-lo endoscopicamente, nem sempre é possível nos cálculos ureterais proximais, pois a introdução do ureteroscópio até o cálculo pode ser difícil ou tecnicamente impossível, pelas características anatômicas do paciente, ou quadro de infecção associada, por se impor septicemia. 

Nas situações onde a extração do cálculo não pode ser feita, ainda assim a desobstrução com a introdução de cateter ureteral deve ser considerada como a forma mais eficaz de preservação da função renal.

Ureter médio

Cálculo impactados no ureter médio também representam um desafio, pois o cálculo pode não ser acessível endoscopicamente, enquanto a opção de litotripsia extra-corpórea ureteral apresenta limitações determinadas pela dificuldade em se visualizar o cálculo numa região próxima da coluna, impedindo sua localização e visualização, que impedem de “mirar” eficazmente no cálculo. Além disto, o cálculo pode se impactar em algumas áreas de “sombra” do método de imagem utilizado para localizar o cálculo para que seja fragmentado, impedindo ou limitando severamente a eficácia do método. Desta maneira, os índices de clareamento de cálculos ureterais médios oscilam entre 45 a 80%, também a depender do tamanho e dureza do mesmo.

Ureter Distal

A região ureteral distal é o local mais comum de impactação de cálculos ureterais. Felizmente, a evolução dos recursos de fibras ópticas permitiu acessar esta região do ureter de maneira eficaz e altamente resolutiva. 

A ureteroscopia representa hoje a maneira mais rápida e eficaz para se extrair cálculos alojados no ureter distal. Deve ser lembrado que esta região apresenta 4 pontos críticos de impactação do cálculo no ureter por representarem pontos críticos de estrangulamento funcional ou anatômico do ureter.

  • Cruzamento com os vasos ilíacos
  • Cruzamento com as tubas uterinas 
  • Hiato ureteral 
  • Válvula uretero-vesical

Ainda assim, através de dilatação endoscópica, pode-se adentrar o ureter e localizar o cálculo permitindo sua eficaz fragmentação.

Alguns casos exigem a colocação de catéter ureteral (catéter Duplo- J), a fim de garantir a pervidade do ureter para a drenagem urinária por curto período de tempo. Entretanto, muitos casos, dependendo do tamanho do cálculo, tempo de impactação (obstrução) e dificuldade para se retirá-lo, não exigem a colocação do catéter, dando grande conforto ao paciente.

Estudos recentes têm mostrado que em cálculos ureterais tratados com litotripsia extra-corpórea ou ureteroscopia, aqueles tratados com ureterolitotripsia mostram maior vantagem econômica, social e de sucesso para resolução da obstrução urinária ureteral,favorecendo assim o tratamento cirúrgico endoscópico, pois enquanto a primeira opção resolve 60% dos casos, o tratamento cirúrgico “limpa” o ureter em 98 a 100% dos casos.

Tratamentos Conservadores (Não–Cirúrgicos)

Ingesta de Líquidos e Modificações na dieta

A ingesta de líquidos e constitui-se na forma primária mais eficiente para se evitar a recorrência dos cálculos renais. Estudos controlados comparativos demonstraram que ao se aumentar a ingesta líquida para cerca de 2000 ml/dia, pode-se efetivamente diminuir a recorrência de cálculos renais de 40 a 50% dos casos (Borghi L, Meschi T, Amato F, Briganti A, Novarini A, Giannini A: Urinary volume, water and recurrences in idiopathic calcium nephrolithiasis: a 5-year randomized prospective study. J Urol 1996;155:839–843). 

Deve-se no entanto, ter em mente que ao se aumentar muito a ingesta de líquidos, pode-se em alguns casos se ter o efeito inverso do desejado, resultado da extrema diluição, e consequente diminuição dos fatores protetores naturais da cristalização dos solutos, como por exemplo  diminuição de quantidade de citrato na urina. aumentando-se paradoxalmente o risco de se formar cálculos renais.

Outras modificações dietéticas com restrições de alguns alimentos ricos em oxalato podem pontualmente reduzir o conteúdo de oxalato na urina (espinafre, rubarbo, chocolate, castanhas de modo geral e soja). 

Adicionalmente, recursos que modifiquem a dieta do paciente com cálculos renais recorrentes, tais como, encorajar-se a substituição de proteína animal por proteína vegetal, também produz efeitos desejáveis, com alcalinização urinária e diminuição da excreção de urato (e portanto, do ácido úrico), minimizando a chance de cálculos de oxalato de cálcio no rim.

O legendário aumento da ingesta de cerveja, como forma de combater cálculos renais, baseia-se na ingesta aumentada de líquidos, mas se deve lembrar que a cerveja tem alto conteúdo de purina, e assim como a ingesta de vinhos vermelhos fortes, pode aumentar a chance de cálculos de ácido úrico, que devem ser evitados. 

Cálculos de Oxalato de cálcio, decorrentes de hipercalciúria idiopática podem ser eficazmente tratados com uso de tiazídicos produzindo efeito preventivo em 70% dos casos, ainda que associado a hipocalemia (baixa quantidade sérica do potássio), que se mostra como um efeito colateral indesejado do tratamento.

Em casos de calculos de ácido úrico secundários à “gota”, o allopurinol tomado diariamente reduz a incindência de cálculos de ácido úrico, e paralelamente também reduzir a formação incipiente de núcleos microscópicos de cálculos de ácido úrico, que posteriormente se avolumam com camadas adicionais de oxalato formando cálculos de oxalato ou fosfato de cálcio, naqueles pacientes com hiperoxalúria.