Incontinência Urinária nas Mulheres

por Dr. Paulo Rodrigues

Introdução

As perdas urinárias que ocorrem devido ao aumento secundário da pressão intra-abdominal; isto é; quando se faz esforços (por exemplo; tossir, espirrar, agachar, fazer exercícios, etc.) afetam 15 a 35% das mulheres. 

A variação na prevalência da ocorrência de perdas urinárias é tão larga, pois as estatísticas dependem da idade das mulheres pesquisadas, e da frequência com que as perdas urinárias acontecem.

Em determinados grupos, a ocorrência de perdas urinárias involuntárias pode atingir até 50%, como nos casos de pessoas já na menopausa ou multíparas (que tiveram mais de 4 partos vaginais).

A falta de uma definição consensual de como, e quando se caracteriza o diagnóstico de incontinência urinária cria obstáculos, que não permitem comparações diretas entre diferentes populações, fazendo as estatísticas variarem muito.

A perda involuntária de urina é motivo de reclusão social, perdas da auto-estima, absenteísmo sexual e perda da qualidade de vida. 

Por estes motivos, cerca de somente 1 em cada 10 mulheres nos USA submetem-se a tratamentos cirúrgicos, enquanto as restantes carregam o peso de se esconderem, ou contornam o problema, utilizando protetores higiênicos, mudando hábitos pessoais, ou usando medicamentos regularmente.

Como anteriormente mencionado, a prevalência das perdas urinárias, depende da população estudada e da forma como se pergunta se as perdas urinárias ocorrem; por exemplo: 

  • Você perdeu urina na última semana?, ou
  • Você já perdeu urina na sua vida? 

Refletem de maneiras diferentes, como as perdas urinárias pertubam uma paciente ou são avaliadas pelos pesquisadores.

Num estudo regional norueguês, constatou-se que 50% das mulheres já tinham apresentado perdas urinária, e que 25% das mulheres apresentam-na com regularidade de pelo menos 1 vez por semana, enquanto 15% perdem urina diariamente.

Interessante mencionar que, embora não haja uma clara linha de definição que separe casos de incontinência urinária grave, dos casos mais amenos, um estudo norueguês na cidade de Rissa, demonstrou que 5% das pacientes referiam sua incontinência como leve, 27% como moderada e 68% como severa, onde leve significaria perdas urinárias de apenas algumas gotas poucas vezes no mês, grau moderado significaria perdas urinárias pequenas, mas diárias; e incontinência urinária severa, aqueles casos onde há perdas urinárias maciças pelo menos 1x/semana.

Embora muitas pacientes achem que as perdas urinárias sejam uma única doença; a incontinência ocorre devido à diferentes motivos. 

Pode ocorrer por aumento da pressão intra-abdominal durante os movimentos (exercícios, espirro, tosse, risadas, agachamento, pular, etc.), que aumentam a pressão no interior da bexiga, e que ultrapassam a pressão de contenção da uretra, que não conseguindo se coaptar (fechar), não evita a saída de urina – Incontinência Urinária aos Esforços ou de Estresse.

No entanto, a bexiga pode também se contrair involuntariamente; e provocar repentino e intenso desejo de urinar. 

Nestes casos, a intensidade da contração involuntária do músculo da bexiga pode ser tanta, que a uretra não consegue se opor à força expulsora da bexiga, também provocando saída involuntária de urina – Incontinência Urinária por Urge-incontinência ou Bexiga Hiperativa.

Um terceiro tipo de perdas urinárias compreende a mistura de ambas – Incontinência Urinária Mista (por Esforço + por Bexiga Hiperativa).

O reconhecimento adequado do motivo das perdas urinárias é determinante para se conseguir altos índices de cura e controle clínico das perdas urinárias.

A frequência de perdas urinárias por urge-incontinência aumenta com a idade, enquanto que as perdas urinárias por esforço diminuem ou se estabilizam a partir dos 60 anos, um processo possivelmente relacionado com o envelhecimento e perda da elasticidade da bexiga (Hannestad YS et cols. The Norwegian EPINCOT study. Epidemiology of Incontience in the county of Nord-Trodelang. J Clin Epidemiol 53: 1150, 2000).

Definição e diagnóstico

Distinguem-se perdas urinárias de várias formas:

  • Incontinência urinária de esforço ou estresse – quando há perda de urina em situações de esforço físico que promovam a contração da musculatura abdominal
  • Urge-Incontinência urinária – quando há perda de urina acompanhada ou precedida de desejo urgente urinar
  • Mista – perdas urinárias aos esforços com atividade vesical involuntária, caracterizada como bexiga hiperativa.

O diagnóstico de incontinência é fundamentalmente clínico, mas o uso de estudo urodinâmico pode auxiliar e estabelecer a causa exata das perdas urinárias.

Outros testes podem também ser utilizados para identificar casos inconclusivos ou mesmo mensurar a gravidade das perdas urinárias.

Assim, o teste do modess (test-pad) consiste na utilização de modess por 1, 6 ou 24 horas, permitindo medir precisamente a quantidade de urina perdida naquele intervalo de tempo. 

A carta de micção, também é um instrumento de verificação utilizada, co a colaboração da própria paciente, que mede e orienta o volume urinado e a frequência de micçoes, ajudando a estabelecer a frequência e severidade das perdas urinárias.

O tipo de incontinência urinária é de fundamental importância para se determinar qual a melhor terapia.

Casos de perdas urinárias mistas, ou motivadas exclusivamente por bexiga hiperativa, apresentam índices de melhora clínica inferiores aos de casos puramente devido aos esforços abdominais – Incontinência de Esforço.

Pesquisas feitas para se estabelecer as causas das perdas urinárias revelam que 38% das mulheres perdem urina após um forte desejo miccional, sendo que 14% destas mulheres têm perdas urinárias diariamente.

O estudo da ocorrência de perdas urinárias numa população pode ser enganosa, pois reconhece-se que muitas mulheres apresentam melhora espontânea das perdas urinárias em diferentes períodos da vida ou do ano, fazendo com que as estatísticas variem ou flutuem. Mas sabe-se que somente 10 – 20% das mulheres referem melhora, de maneira consistente, quando acompanhadas por um período de 2 anos. 

O que se observa é uma variação periódica nos sintomas, condicionados a pequenas mudanças de hábitos ou diminuição das atividades físicas, que podem passar despercebidos, variando ainda também de acordo com a quantidade de líquido ingerido e outras circunstâncias externas do dia-a-dia, que influenciam na ocorrência das perdas urinárias (Herzog AR et cols.. Two-year incidence, remission, and change in patterns of urinary incontinence in noninstitutionalized older adults. J Gerontol 45:M67,1990).

Fatores de Risco

Não se sabe ao certo porquê algumas mulheres desenvolverão perdas urinárias aos esforços, enquanto outras não.

Reconhece-se; no entanto, através de estudos populacionais, que alguns fatores de risco influem significativamente.

  Aumento do risco de ter incontinência Urinária
Gravidez 1,8 vezes
Parto cesáreo 1,5 vezes
Parto normal 3,2 vezes
Episiotomia 5 vezes
Uso de forceps 6,2 vezes
Feto maior que 4 kg 11,2 vezes

A gravidez, mas em particular o parto vaginal, parece ser o elemento mais decisivo para que a incontinência urinária se desenvolva.

Entretanto, também o envelhecimento, e as alterações hormonais decorrentes da menopausa, alteram sobremaneira o tônus da musculatura pélvica facilitando o escape de urna, em situações inconvenientes.

Ademais, fatores genéticos e familiares, também contribuem, pois o invólucro de colágeno dos ligamentos e dos músculos, pode facilitar a deterioração das forças mecânicas que forçam a bexiga para baixo, em situações de tosse, espiro, risos ou saltos.

Tratamento

Menos da metade das mulheres com perdas urinárias procuram auxílio médico! (Kinchen KS et cols. Factors Associated with women´s decisions to seek treatment for urinary incontinence. J Womens Health (Larchmt) 12: 687, 2003)

Infelizmente, muitas mulheres aguardam melhora espontânea das perdas urinárias perdendo precioso tempo e qualidade de vida para restaurar sua condição de saúde.

Verifica-se que as mulheres que mais freqüentemente procuram ajuda médica, são aquelas que têm “acidentes” maiores com perdas urinárias, têm suas vidas limitadas pela incontinência e que usam vários protetores higiênicos.

Infelizmente, também se reconhece que a severidade das perdas urinárias também influencia no resultado final pós-cirúrgico. Assim tratar de uma perda urinária leve produz resultados clínicos melhores e mais consistentes do que mulheres que apresentem incontinência mais grave e severa.

Tratamentos não-cirúrgicos, tais como exercícios pélvicos, fisioterapia dirigida e eletro-estimulação são opções para pacientes muito motivados e que querem evitar o recurso cirúrgico, mas deve-se ter em mente que os resultados são muito mais modestos, inconsistentes e  pouco duradouros, uma vez que se sabe que a incontinência urinária decorre da perda da sustentação da uretra e da bexiga, por atrofia, envelhecimento ou lesões da musculatura pélvica.

Deve-se ainda registrar que os resultados variam de acordo com a aderência da paciente ao regime de exercícios, e às condições musculares da pelve. 

Casos onde o comprometimento muscular é avançado, isto é, quando as fibras musculares já foram substituídas por tecido cicatricial, o fortalecimento muscular pélvico torna-se impossível. Igualmente, se há rotura da fáscia de sustentação pélvica, os exercícios não têm como reconstituir a anatomia.

A cirurgia continua sendo o pilar básico para o tratamento das perdas urinárias aos esforços.

Estudos de acompanhamento clínico e de cura demonstram claramente que as cirurgias do tipo colpo-perineorrafia anterior e suspensões por agulha, apresentam evidente comprometimento dos índices de cura no decorrer de anos, com recorrência das perdas urinárias num prazo de 3 a 5 anos em mais de 50% dos casos quando comparadas com outras técnicas; levando a popularização e sedimentação de técnicas cirúrgicas, que se são mais sofisticadas, apresentam índices de sucesso mais consistentes, e permanentes.

A compreensão da fisio-patologia da incontinência urinária de esforço permitiu a adoção de técnicas cirúrgica que substituem os tecidos pélvicos com telas de heterólogas, dando suporte resistente à uretra. As cirurgias de Sling, que se propõe à correção do desgaste tecidual apresentam resultados duradouros e índices de cura que se aproximam de 100%.

Tais técnicas se desenvolveram à luz de resultados melhores e mais consistentes, ao mesmo tempo em que a permanência hospitalar diminuiu, em virtude de sua natureza minimamente invasiva.

Custos de apresentar Incontinência Urinária

Apresentar incontinência urinária apresenta expressivo impacto psico-social e econômico. 

Infelizmente, muitos médicos não utilizam todo o potencial de tratamento e investigação das causas das perdas urinárias, relegando muitas pacientes à condições miseráveis de convivência social e pessoal.